domingo, 27 de janeiro de 2019

O FERRADOR...




 ....de Cavalos


 Em que língua falarei
 ao ferrador de cavalos?
 Por que na minha língua
 de assombro e vogal,
 só falo a mim mesmo
 — ao meu nada e ao meu tudo —
 e nem sequer disponho
 do gesto dos mudos?
Se as palavras morrem
à míngua como os homens
e se o silêncio
fala seu próprio idioma
em que língua direi
ao homem diferente
quando o vejo ferrar
o casco de um cavalo
que ele é meu semelhante?
Empunhando o martelo
ele me conta histórias
de cravos perdidos
e cavalos mancos.
Palavras que se perdem
como ferraduras
no caminho do pasto.

 Lêdo Ivo, in 'A Noite Misteriosa


No post anterior, o osso amigo Pedro Luso falou deste escritor brasileiro que eu desconhecia. Fui pesquisar e gostei muito deste poema. Espero que também vos agrade! Obrigada, Pedro!

Emília Pinto

quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

ÁFRICA








Foto - net






Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?
Em que mundo, em qu'estrela tu t'escondes
Embuçado nos céus?
Há dois mil anos te mandei meu grito,
Que embalde desde então corre o infinito...
Onde estás, Senhor Deus?...

Qual Prometeu tu me amarraste um dia
Do deserto na rubra penedia
 — Infinito: galé!...
Por abutre — me deste o sol candente
E a terra de Suez — foi a corrente
Que me ligaste ao pé...

O cavalo estafado do Beduíno
Sob a vergasta tomba ressupino
E morre no areal.
Minha garupa sangra, a dor poreja
Quando o chicote do simoun dardeja
O teu braço eternal

 Minhas irmãs são belas, são ditosas...
 Dorme a Ásia nas sombras voluptuosas
 Dos haréns do Sultão.
 Ou no dorso dos brancos elefantes
 Embala-se coberta de brilhantes
 Nas plagas do Hindustão.

 Por tenda tem os cimos do Himalaia...
 Ganges amoroso beija a praia
 Coberta de corais ...
 A brisa de Misora o céu inflama;
 E ela dorme nos templos do Deus Brama,
 — Pagodes colossais...

 A Europa é sempre Europa, a gloriosa!...
 A mulher deslumbrante e caprichosa,
 Rainha e cortesã.
 Artista — corta o mármor de Carrara;
 Poetisa — tange os hinos de Ferrara,
 No glorioso afã!...

 Sempre a láurea lhe cabe no litígio...
 Ora uma c'roa, ora o barrete frígio
 Enflora-lhe a cerviz.
 Universo após ela — doudo amante
 Segue cativo o passo delirante
 Da grande meretriz. ....................................

 Mas eu, Senhor!... Eu triste abandonada
 Em meio das areias esgarrada,
 Perdida marcho em vão!
 Se choro... bebe o pranto a areia ardente;
 talvez... p'ra que meu pranto, ó Deus clemente!
 Não descubras no chão...

 E nem tenho uma sombra de floresta...
 Para cobrir-me nem um templo resta
 No solo abrasador...
 Quando subo às Pirâmides do Egito
 Embalde aos quatro céus chorando grito:
 "Abriga-me, Senhor!..."

 Como o profeta em cinza a fronte envolve,
 Velo a cabeça no areal que volve
 O siroco feroz...
 Quando eu passo no Saara amortalhada...
 Ai! dizem: "Lá vai África embuçada
 No seu branco albornoz... "

 Nem vêem que o deserto é meu sudário,
 Que o silêncio campeia solitário
 Por sobre o peito meu.
 Lá no solo onde o cardo apenas medra
 Boceja a Esfinge colossal de pedra
 Fitando o morno céu.

 De Tebas nas colunas derrocadas
 As cegonhas espiam debruçadas
 O horizonte sem fim ...
 Onde branqueia a caravana errante,
 E o camelo monótono, arquejante
 Que desce de Efraim .......................................

 Não basta inda de dor, ó Deus terrível?!
 É, pois, teu peito eterno, inexaurível
 De vingança e rancor?...
 E que é que fiz, Senhor?Que torvo crime eu cometi jamais que assim me oprime
Teu gládio vingador?! ........................................

 Foi depois do dilúvio... um viadante,
 Negro, sombrio, pálido, arquejante,
 Descia do Arará...
 E eu disse ao peregrino fulminado:
 "Cam! ... serás meu esposo bem-amado...
 — Serei tua Eloá. . . "

 Desde este dia o vento da desgraça
 Por meus cabelos ululando passa
 O anátema cruel.
 As tribos erram do areal nas vagas,
 E o nômade faminto corta as plagas
 No rápido corcel.

 Vi a ciência desertar do Egito...
 Vi meu povo seguir — Judeu maldito
 — Trilho de perdição.
 Depois vi minha prole desgraçada
 Pelas garras d'Europa — arrebatada
 — Amestrado falcão! ...

 Cristo! embalde morreste sobre um monte
 Teu sangue não lavou de minha fronte
 A mancha original.
 Ainda hoje são, por fado adverso,
 Meus filhos — alimária do universo
, Eu — pasto universal...

 Hoje em meu sangue a América se nutre
 Condor que transformara-se em abutre
,Ave da escravidão,
 Ela juntou-se às mais... irmã traidora
 Qual de José os vis irmãos outrora
 Venderam seu irmão.

 Basta, Senhor! De teu potente braço
 Role através dos astros e do espaço
 Perdão p'ra os crimes meus!
 Há dois mil anos eu soluço um grito...
 escuta o brado meu lá no infinito,
 Meu Deus! Senhor, meu Deus!!...

 São Paulo, 11 de junho de 1868 -   Vozes D'África de CASTRO ALVES

Infelizmente. o " brado " continua a não ser escutado

Emília Pinto

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

RECOMEÇAR





Mesmo que o HOJE te dê um não, lembre-se que há um AMANHÃ melhor, a certeza de que os nossos caminhos devemos traçar ao lado de quem nos ama; com amor, paz, confiança e felicidade, é a base para se recomeçar. Um recomeço, pra pensar no que fazer agora, acreditando em si mesmo, na busca do que será prioridade daqui pra frente; PLANOS? Pra que os fizemos, já que o amanhã é mistério? A qualquer momento pode ser tempo, de revisar os conceitos e ações, e concluir, que tudo aquilo que você viveu marcou, porém não foi suficiente pra que continuasse. As lembranças passadas ficam, tudo que vivemos era pra ser vivido , o destino é como um livro do qual nós somos os autores, ele não vêm pronto, antes de nascermos ele está em branco, ao nascermos introduzimos as primeiras passagens, um começo, com o tempo através das escolhas vamos escrevendo-o página por página, rabiscadas, rasgadas ou marcadas, onde encontramos obstáculos onde indicarão a melhor hora pra recomeçar, nos últimos dias de vida concluiremos, e no final deixamos nossas historias marcadas no coração daqueles, que sempre farão parte de nossa historia, onde quer que estejam.

 Recomeçar é dar uma nova chance a si mesmo, é renovar as esperanças na vida e o mais importante, acreditar em você de novo.


 Carlos Drummond de Andrade

Começou um novo ano e com ele vem sempre a esperança de um novo caminho, de uma mudança de atitudes, de uma sociedade mais humana, mas, não nos esqueçamos que a cada instante do nosso dia há um novo começo e, portanto há sempre a oportunidade de mudar o rumo se tivermos coragem e forças para isso. Nem sempre as temos e nem sempre nos é permitido mudar!  TENTEMOS, pelo menos!
Agradeço a todos os amigos a companhia que me têm feito e espero que este ano continue a dar-nos a saúde necessária para continuarmos juntos

Beijinhos
Emília Pinto