quinta-feira, 23 de junho de 2022

BALÕEZINHOS

 

Imagem Pixabay 


Na feira do arrabaldezinho 
Um homem loquaz apregoa balõezinhos de cor: 
— "O melhor divertimento para as crianças!
Em redor dele há um ajuntamento de menininhos pobres, 
Fitando com olhos muito redondos os grandes balõezinhos muito redondos. 

No entanto a feira burburinha. 
Vão chegando as burguesinhas pobres, 
E as criadas das burguesinhas ricas, 
E mulheres do povo, e as lavadeiras da redondeza. 

Nas bancas de peixe, 
Nas barraquinhas de cereais, 
Junto às cestas de hortaliças 
O tostão é regateado com acrimônia. 

Os meninos pobres não veem as ervilhas tenras, 
Os tomatinhos vermelhos, 
Nem as frutas, 
Nem nada. 

Sente-se bem que para eles ali na feira os balõezinhos de cor 
são a única mercadoria útil e verdadeiramente indispensável. 

 O vendedor infatigável apregoa: 
— "O melhor divertimento para as crianças!" 
E em torno do homem loquaz os menininhos pobres 
fazem um círculo inamovível de desejo e espanto

Manuel Bandeira.

O mês de Junho está a chegar ao fim e com ele a minha homenagem às crianças; escolhi este poema que nos mostra que é preciso muito pouco para fazer uma criança feliz, basta um balão colorido para que os seus olhinhos brilhem de contentamento. Infelizmente há milhares por esse mundo fora que não conseguem ter a alegria de correr pela rua, segurando  um balãozinho.

Emília Pinto  

domingo, 19 de junho de 2022

O MENINO POBRE

 

Este menino vende doces na rua para que o seu pai ( cadeirante ) não precise de trabalhar ao sol 
-imagem da net



Crianças em destaque, novamente, aqui no Começar de Novo mas, desta vez vou tratar um tema que muito sensibiliza  todos os que se preocupam com estes seres que tanto sofrem, o trabalho Infantil 
 

Criança não pode trabalhar, criança tem de brincar, criança tem de frequentar a escola
Concordo, em absoluto que é assim que tem de ser

Amigos, depois de ter lido a crónica da nossa Amiga Taís Luso - Porto das crónicas  que muito me sensibilizou, pedi-lhe autorização para transcrever partes do texto que me deixou de lágrimas nos olhos, não só por já ter enfrentado essa situação, mas também por, de certeza, agir da mesma forma
Como podem ver na imagem que escolhi, esta criança está feliz, apesar do trabalho e o " MENINO POBRE " que abordou a nossa Amiga, com certeza ficou com os  os olhinhos a brilhar de felicidade

." Estávamos nós três, Pedro, Alexandre e eu numa cafeteria, quando entrou um menino, pequenino, devia ter uns 6 ou 7 aninhos e com uma pequena pilha de panos de prato (panos de copa) oferecendo nas mesas. Muito seguro e tranquilo, com postura de homenzinho, chamou muito a nossa atenção. Chegou na nossa mesa, ofereceu os paninhos: 3 por 20,00 - disse ele. Eu agradeci, pois mexer em dinheiro, tomando cafezinho e comendo os pãezinhos de queijo, não daria! Ele me fitou e disse:

– Mas aceito PIX! ( pagamento instantâneo ao banco...)

Saímos da porta da cafeteria e lá fora estava o menino oferecendo os paninhos nas mesas que ficam debaixo dos guarda-sóis. Pensei em dar um dinheiro para ele sem pegar os paninhos, mas Alexandre me disse baixinho:

– Compra, mãe, ele vai se sentir melhor, está trabalhando! Não tira a dignidade dele! "

Comprei os paninhos, com dinheiro, sorri para a criança e dei um beijo no meu filho pela sua sensibilidade "

Obrigada Taís, muito obrigada Alexandre !

Este MENINO POBRE. assim como o da gravura acima, não estavam a pedir esmola, estavam a trabalhar e só queriam que o seu trabalho fosse valorizado .Têm de certeza muito amor e carinho em casa e entenderam que poderiam, de alguma forma, contribuir para que não lhes faltasse comida na mesa. Não é preciso muito para uma criança ser feliz

Também aprendi muito, Taís! Obrigada

Espero que gostem, Amigos

Emília Pinto 


 

terça-feira, 14 de junho de 2022

DE NOVO , AS CRIANÇAS

 imagem pixabay


Algumas proposições com crianças

A criança está completamente imersa na infância 
a criança não sabe que há-de fazer da infância 
a criança coincide com a infância 
a criança deixa-se invadir pela infância como pelo sono 
deixa cair a cabeça e voga na infância
a criança mergulha na infância como no mar 
a infância é o elemento da criança 
como a água é o elemento próprio do peixe 
a criança não sabe que pertence à terra 
a sabedoria da criança é não saber que morre 
a criança morre na adolescência 
Se foste criança diz-me a cor do teu país 
Eu te digo que o meu era da cor do bibe 
e tinha o tamanho de um pau de giz 
Naquele tempo tudo acontecia pela primeira vez 
Ainda hoje trago os cheiros no nariz 
Senhor que a minha vida seja permitir a infância 
embora nunca mais eu saiba como ela se diz 

 Ruy Belo, in 'Homem de Palavra[s]'  


Façamos a nossa parte para que as crianças possam viver a infância sem sofrimento

Emília Pinto

terça-feira, 7 de junho de 2022

EM LOUVOR......

...das Crianças 

Se há na terra um reino que nos seja familiar e ao mesmo tempo estranho, fechado nos seus limites e simultaneamente sem fronteiras, esse reino é o da infância. A esse país inocente, donde se é expulso sempre demasiado cedo, apenas se regressa em momentos privilegiados — a tais regressos se chama, às vezes, poesia. Essa espécie de terra mítica é habitada por seres de uma tão grande formosura que os anjos tiveram neles o seu modelo, e foi às crianças, como todos sabem pelos evangelhos, que foi prometido o Paraíso. A sedução das crianças provém, antes de mais, da sua proximidade com os animais — a sua relação com o mundo não é a da utilidade, mas a do prazer. Elas não conhecem ainda os dois grandes inimigos da alma, que são, como disse Saint-Exupéry, o dinheiro e a vaidade. Estas frágeis criaturas, as únicas desde a origem destinadas à imortalidade, são também as mais vulneráveis — elas têm o peito aberto às maravilhas do mundo, mas estão sem defesa para a bestialidade humana que, apesar de tanta tecnologia de ponta, não diminui nem se extingue. O sofrimento de uma criança é de uma ordem tão monstruosa que, frequentemente, é usado como argumento para a negação da bondade divina. Não, não há salvação para quem faça sofrer uma criança, que isto se grave indelevelmente nos vossos espíritos. O simples facto de consentirmos que milhões e milhões de crianças padeçam fome, e reguem com as suas lágrimas a terra onde terão ainda de lutar um dia pela justiça e pela liberdade, prova bem que não somos filhos de Deus.


Eugénio de Andrade, in 'Rosto Precário

 "Não, não há salvação para quem faça sofrer uma criança, que isto se grave indelevelmente nos vossos espíritos."


Esta frase em negrito basta, não é preciso dizer mais nada
Só quero dizer que vou dedicar às crianças este mês de Junho,

Emília Pinto 

quarta-feira, 1 de junho de 2022

SER CRIANÇA

 Imagem da net


Eu tenho um ermo enorme dentro do olho. Por motivo do ermo não fui um menino peralta. Agora tenho saudade do que não fui. Acho que o que faço agora é o que não pude fazer na infância. Faço outro tipo de peraltagem. Quando eu era criança eu deveria pular muro do vizinho para catar goiaba. Mas não havia vizinho. Em vez de peraltagem eu fazia solidão. Brincava de fingir que pedra era lagarto. Que lata era navio. Que sabugo era um serzinho mal resolvido e igual a um filhote de gafanhoto. Cresci brincando no chão, entre formigas. De uma infância livre e sem comparamentos. Eu tinha mais comunhão com as coisas do que comparação. Porque se a gente fala a partir de ser criança, a gente faz comunhão: de um orvalho e sua aranha, de uma tarde e suas garças, de um pássaro e sua árvore. Então eu trago das minhas raízes crianceiras a visão comungante e oblíqua das coisas. Eu sei dizer sem pudor que o escuro me ilumina. É um paradoxo que ajuda a poesia e que eu falo sem pudor. Eu tenho que essa visão oblíqua vem de eu ter sido criança em algum lugar perdido onde havia transfusão da natureza e comunhão com ela. Era o menino e os bichinhos. Era o menino e o sol. O menino e o rio. Era o menino e as árvores. 



 Manoel de Barros, in 'Memórias inventadas – As Infâncias de Manoel de Barros


Hoje, dia internacional da criança, escolhi este texto  pela ternura e simplicidade- É muito fácil fazer uma criança feliz e Manoel de Barros mostra-nos isso neste pequeno relato da sua infância

Lembremos, hoje e sempre as crianças que sofrem  todo o tipo de violência e que, apesar da riqueza do mundo em geral, ainda morrem de fome

Emília Pinto