sábado, 23 de outubro de 2021

DAR ....




Um Pouco Mais de Nós 



Podes dar uma centelha de lua, 
um colar de pétalas breves 
ou um farrapo de nuvem; 
podes dar mais uma asa 
a quem tem sede de voar 
ou apenas o tesouro sem preço 
do teu tempo em qualquer lugar; 
podes dar o que és e o que sentes
sem que te perguntem 
nome, sexo ou endereço; 
podes dar em suma, com emoção, 
tudo aquilo que, 
em silêncio, te segreda o coração
podes dar a rima sem rima 
de uma música só tua 
a quem sofre a miséria 
dos dias na noite
sem tecto de uma rua;
podes juntar o diamante da dádiva 
ao húmus de uma crença forte e antiga, 
sob a forma de poema ou de cantiga; 

podes ser o livro, o sonho, 
o ponteiro do relógio da vida sem atraso, 
e sendo tudo isso serás ainda mais, 
anónimo, pleno e livre, 
nau sempre aparelhada para deixar o cais, 
porque o que conta, vendo bem, 
é dar sempre um pouco mais
sem factura, sem fama, sem horário, 
que a máxima recompensa de quem dá 
é o júbilo de um gesto voluntário
E, afinal, tudo isso quanto vale ? 
Vale o nada que é tudo 
sempre que damos de nós o que, 
sendo acto amor, ganha voz 
e se torna eterno por ser único e total.


José Jorge Letria


" O que conta é dar sempre um pouco de nós aos outros", principalmente àqueles que mais precisam 

Emília Pinto

segunda-feira, 11 de outubro de 2021

POVO

 





Não quero sentir a solidão  
e a distância de meu povo. 
Não quero sentir medo 
nem ver o medo que o povo sente.
Quero sentir o povo unido
Quero vê-lo de mãos dadas, 
construindo um mundo sem fome
sem guerras e cheio de rosas. 
Quero ver o povo sendo povo


Que aqueles que vivem da ilusão,
ouvindo o seu próprio eco, 
desçam dos tronos porque a alegria 
dos reis, imperadores e ditadores 
só existe na fantasia. 
 – Que todos sejam apenas povo

Sérgio Mattos. 1979


Conheci este escritor brasileiro através do blog da nossa Amiga Tais Luso  - Porto das Crónicas onde ela publicou um belo poema de Sergio Mattos. Fui pesquisar e encontrei  outros trabalhos poéticos que me agradaram . Escolhi este para partilhar com os meus amigos Espero que gostem

Obrigada Taís!


Se  dermos as mãos, se soubermos ser um povo unido, com certeza , a vida será mais fácil para todos

Emília Pinto

sexta-feira, 1 de outubro de 2021

OUTONO

 


FAMÍLIA DESENCONTRADA

O Verão é um senhor gordo, sentado na varanda, 
suando em bicas e reclamando cerveja. 

 O Outono é um tio solteirão que mora lá em cima no sótão e a toda hora protesta aos gritos: 
"Que barulho é este na escada?!" 

 O Inverno é o vovozinho trêmulo, 
com a boina enterrada até os olhos, 
a manta enrolada nos queixos e sempre resmungando: 
"Eu não passo deste agosto, eu não passo deste agosto..."

 A Primavera, em contrapartida - é ela quem salva a honra da família!
é uma menininha pulando na corda 
cabelos ao vento pulando e cantando 
debaixo da chuva 
curtindo o frescor da chuva que desce do céu 
o cheiro da terra que sobe do chão 
o tapa do vento cara molhada! 
 
Oh! a alegria do vento desgrenhando as árvores 
revirando os pobres guarda-chuvas 
erguendo saias! 
A alegria da chuva a cantar nas vidraças sob as vaias do vento... 
Enquanto - desafiando o vento, 
a chuva, desafiando tudo - no meio da praça 
a menininha canta 
a alegria da vida 
a alegria da vida!

Mário Quintana


Há muito que dizemos que as estações do ano estão bastante " baralhadas ", devido  às alterações climáticas  e aqui, neste poema, vemos Mário Quintana, com bastante humos a falar desta " família ", onde ninguém se entende. Também nós, reclamamos sempre...nunca estamos satisfeitos com o clima.

Achei muito engraçado este poema, Amigos! 

Emília Pinto