domingo, 23 de março de 2014

DISCRIÇÃO.....




.... a arte de desaparecer. Desaparecer momentaneamente para se abandonar ao aparecimento do outro. Apagamo-nos para que um outro mundo surja – o mundo do outro e não o meu. Pierre Zaoui, autor de “La Discretion”, apresenta-nos esta virtude como uma experiência de ligeiro desaparecimento, não no sentido de morte, mas no sentido de deixar de se mostrar; um momento de colocar em suspenso o nosso desejo de afirmação. Vivemos num mundo de egos sobredimensionados e autocentrados em que deixamos pouco espaço ao outro. Numa sociedade que valoriza “o parecer ser” a discrição surge-nos como uma forma feliz de resistência. Mas atenção, não se trata de “vivamos felizes, vivamos escondidos”. Há momentos nas nossas existências que exigem que se fale, que nos manifestemos, que nos pronunciemos, momentos em que aparecer é uma necessidade. Faz parte da coragem, da inserção, da participação numa vida pública, amorosa, social, democrática. Há, enfim, momentos para a discrição e momentos para não o ser, mas todos devíamos experimentar estes momentos de invisibilidade, momentos em que nos recolhemos e simultaneamente nos oferecemos a possibilidade de sair de nós próprios, de nos desprendermos do ego, de apreciar o outro tal como é. Não é dissolver-se no meio dos outros, mas aceitar, por um momento, observá-los, afirmar a presença e a beleza objetiva daqueles que amamos. “Vemos, de facto, o outro, os seus olhos, os seus gestos, as suas mãos, tudo aquilo que nos escapa habitualmente e que, quando amamos, é uma felicidade que apura a nossa sensibilidade. É a alegria de deixar todo o espaço ao outro. A alegria de entrar docemente no seu mundo, de o deixar SER, de aproveitar a sua presença sem qualquer tipo de sedução.” É uma alegria silenciosa.


 Teresa Ferreira, in Bem- Estar-Juntos


Quando nos doamos...quando fazemos alguma coisa para ajudar os outros, sentimos uma grande alegria...um alegria da qual devemos desfrutar mas de uma maneira silenciosa...discreta.

Emília Pinto

quarta-feira, 19 de março de 2014

PAI




Hoje o meu carinho vai todo para você, meu amigo que é pai, ou se não o é, tem um Pai a quem deve homenagem, não só hoje mas todos os dias.

 Desejo-vos um dia muito feliz na companhia dos vossos filhos e que estes saibam dar-vos sempre o amor e a atenção que merecem. Um beijinho muito, muito especial e parabéns!

 Emília Pinto

segunda-feira, 10 de março de 2014

SEGUE....



.....O Teu Destino...
 Rega as tuas plantas...
 Ama as tuas rosas...
 O resto é a sombra...
 De árvores alheias.
 A realidade...
 Sempre é mais ou menos...
 Do que nos queremos....
 Só nós somos sempre...
 Iguais a nós próprios....
 Suave é viver só....
 Grande e nobre é sempre...
 Viver simplesmente...
.Deixa a dor nas aras..
 Como ex-voto aos deuses...
 Vê de longe a vida....
 Nunca a interrogues...
 Ela nada pode dizer-te..
 A resposta está além dos deuses...
 Mas serenamente...
 Imita o Olimpo no teu coração...
 Os deuses são deuses...
 Porque não se pensam.

 Ricardo Reis, in "Odes"-  Heterónimo de Fernando Pessoa

Seguir o nosso destino é " viver simplesmente ", com serenidade...sem interrogar a vida; conseguiremos assim o tão almejado Bem Viver. Claro que não é fácil, mas vale a pena tentar.

Emília Pinto

domingo, 2 de março de 2014

UMA MARAVILHA!




 Num meio-dia de fim de primavera eu tive um sonho como uma fotografia: eu vi Jesus Cristo descer à Terra. Ele veio pela encosta de um monte, mas era outra vez menino, a correr e a rolar-se pela erva
 A arrancar flores para deitar fora, e a rir de modo a ouvir-se de longe. Ele tinha fugido do céu. Era nosso demais pra fingir-se de Segunda pessoa da Trindade.
 Um dia que DEUS estava dormindo e o Espírito Santo andava a voar, Ele foi até a caixa dos milagres e roubou três. Com o primeiro Ele fez com que ninguém soubesse que Ele tinha fugido; com o segundo Ele se criou eternamente humano e menino; e com o terceiro Ele criou um Cristo eternamente na cruz e deixou-o pregado na cruz que há no céu e serve de modelo às outras
. Depois Ele fugiu para o Sol e desceu pelo primeiro raio que apanhou. Hoje Ele vive na minha aldeia, comigo. É uma criança bonita, de riso natural. Limpa o nariz com o braço direito, chapinha nas poças d'água, colhe as flores, gosta delas, esquece. Atira pedras aos burros, colhe as frutas nos pomares, e foge a chorar e a gritar dos cães. Só porque sabe que elas não gostam, e toda gente acha graça, Ele corre atrás das raparigas que levam as bilhas na cabeça e levanta-lhes a saia
. A mim, Ele me ensinou tudo. Ele me ensinou a olhar para as coisas. Ele me aponta todas as cores que há nas flores e me mostra como as pedras são engraçadas quando a gente as tem na mão e olha devagar para elas. Damo-nos tão bem um com o outro na companhia de tudo que nunca pensamos um no outro. Vivemos juntos os dois com um acordo íntimo, como a mão direita e a esquerda
. Ao anoitecer nós brincamos as cinco pedrinhas no degrau da porta de casa. Graves, como convém a um DEUS e a um poeta. Como se cada pedra fosse todo o Universo e fosse por isso um perigo muito grande deixá-la cair no chão. Depois eu lhe conto histórias das coisas só dos homens. E Ele sorri, porque tudo é incrível. Ele ri dos reis e dos que não são reis. E tem pena de ouvir falar das guerras e dos comércios. Depois Ele adormece e eu o levo no colo para dentro da minha casa, deito-o na minha cama, despindo-o lentamente, como seguindo um ritual todo humano e todo materno até Ele estar nu. Ele dorme dentro da minha alma.
 Às vezes Ele acorda de noite, brinca com meus sonhos. Vira uns de pena pro ar, põe uns por cima dos outros, e bate palmas, sozinho, sorrindo para os meus sonhos. Quando eu morrer, Filhinho, seja eu a criança, o mais pequeno, pega-me Tu ao colo, leva-me para dentro a Tua casa. Deita-me na tua cama. Despe o meu ser, cansado e humano. Conta-me histórias caso eu acorde para eu tornar a adormecer, e dá-me sonhos Teus para eu brincar

Fernando Pessoa

Fernando Pessoa e Maria Bethânia juntos, o resultado só poderia ser FABULOSO.

Emília Pinto