Os previdentes e os presidentes tomam de ponta
Os inocentes que têm pressa de voar
Os revoltados fazem de conta fazem de conta...
Os revoltantes fazem as contas de somar.
Embebo-me na solidão como uma esponja
Por becos que me conduzem a hospitais.
O medo é um tenente que faz a ronda
E a ronda abre sepulcros fecha portais;
Os edifícios são malefícios da conjura
Municipal de um desalento e de uma Porta.
Salvo a ranhura para sair o funeral
Não há inquilinos nos edifícios vistos por fora
Que é dos meninos com cataventos na aérea
Arquitetura de gargalhadas em cornucópia?
Almas bovinas acomodadas à matéria
Pastam na erva entre as ruínas da memória,
Homens por dentro abandalhados em unhas sujas
Que desleixaram seu coração num bengaleiro;
Mulheres corujas seriam gregas não fossem as negras
Nódoas deixadas na sua carne pelo dinheiro;
Jovens alheios à pulcritude do corpo em festa
Passam por mim como alamedas de ciprestes
E a flor de cinza da juventude é uma aresta
Que me golpeia abrindo vácuos de flores silvestres
E essa ansiedade de mim mesma me virgula
Paula de pátria entressonhada. É um crisol.
E, o fruto agreste da linfa ardente que em mim circula
Sabe-me a sol. Sabe-me a pássaro. Pássaro ao sol.
Entre mim e a cidade se ateia a perspectiva
De uma angústia florida em narinas frementes.
Apalpo-me estou viva e o tacto subjectiva-me
a galope num sonho com espuma nos dentes.
E invoco-vos, irmãos, Capitães-Mores do Instinto!
Que me acenais do mar com um lenço cor da aurora
E com a tinta azulada desse aceno me pinto.
O cais é a urgência. O embarque é agora
Natália Correia
No tempo de ditadura, a pobreza era enorme, em todos os aspectos. Temos, ainda, de tudo um pouco do que aqui descreve Natália Correia, mas, pelo menos, não precisamos de ter medo do " tenente que faz a ronda"
Emília Pinto
Um poema sublima. Fiquei encantada!
ResponderEliminar.
QUERO VOLTAR...
Beijos e uma excelente semana.
Obrigada, Cidália! Fico feliz que tenhas gostado. Um beijinho e espero que os problemas de saúde estejam a ser resolvidos a contento e que a esperança não vos abandone
EliminarEmilia
Simplesmente maravilhoso e vemos muito disso ainda, com certeza... beijos praianos, chica
ResponderEliminarÉ verdade, Chica, continuamos com problemas semelhantes e não vejo jeito de que algo mude. Um beijinho e saúde para todos aí em casa
EliminarEmilia
Poema deslumbrante que muito gostei de ler. Cumprimentos poéticos
ResponderEliminarQue bom que apreciaste, Ricardo. Um beijinho e muito obrigada
EliminarEmilia
Boa noite de paz, querida amiga Emília!
ResponderEliminarEm meio ao caos da ditadura ou das ditaduras (ainda reinantes, disfarçadas...) vislumbrar:
"E com a tinta azulada desse aceno me pinto."
A cor azul da felicidade minimizar tanta pobreza .
E nenhum tenente de ronda venha perturbar a ordem da humanidade pacificadora.
Tenha dias outonais abençoados!
Beijinhos
Apesar de vivermos em democracia, muitos dos problemas ainda existem e a pobreza é uma delas. A diferença é que podemos protestar sem que nos prendam. O que eu acho que tem aumentado com as democracias é a violência, porque, infelizmente, muitos não entendem o verdadeiro significado da palavra liberdade; pensam que podem fazer o que lhes apetece, sem o minimo de respeito pela liberdade dos outros. Amiga Rosélia, muito obrigada pelo carinho e espero que estejam todos de saúde. Beijinhos
EliminarEmilia
Infelizmente, a situação ainda persiste....Não conhecia este poema da Natália Correia, uma poetisa poderosa.
ResponderEliminarBeijos e abraços
Marta
Olá Marta! Sim, algumas situações ainda persistem, mas muita da miséria que se via naqueles tempos, principalmente nas aldeias, hoje não existe. Claro, há muita coisa que precisa ser feita, mas para isso é urgente uma mudança de mentalidades e essa, Amiga, custa a chegar. Um beijinho e muito obrigada pela visita, Saúde para todos vós
EliminarEmilia
Emília,
ResponderEliminarMuitas vezes passo e vejo
seres completamente alheios
a própria situação.
Sempre me pergunto
como chegaram a esse
ponto?
Cabe a nós não nos
acostumarmos e acharmos
ser normal,
porque ainda que nada possamos
fazer, normal tanta tristeza
vissual, não é.
Obrigada por esse Poema
tão revelador e reflexivo.
Bjins
CatiahoAlc.
Que bom ver-te por cá, Catiaho. Gosto sempre muito do que escreves. Tens razão, pouco podemos fazer, mas ignorar o que se passa à nossa volta é imperdoável, Devemos estar atentos e, sempre que possivel, colaborar para que não haja tanta tristeza. Fazer de conta que certas coisas são normais não é próprio de um ser que se diz humano; fazemos parte desta sociedade e, se cada um fizer um pouquinho, com certeza que o mundo ficará melhor, mas, infelizmente não é o que acontece; ocupamo-nos da nossa vida, como se não existisse mais ninguém e essa atitude faz de nós seres egoístas que nem sequer olham para o lado, tamanha é a pressa. Amiga, um dia destes visitar-te-ei, certo? Muito obrigada pelo carinho e desejo-te dias abençoados, com saúde e serenidade. Beijinhos
EliminarEmilia
Emília, achei seu comentário lá na Chica e fiquei encantada com suas palavras. Acabei de conhecer seu blog e já o sigo! Prazer em conhecer! Abraços!
ResponderEliminarObrigada, Maria Luiza, pelas palavras tão simpáticas. Espero que voltes mais vezes e, já já irei ver o teu cantinho. Fica bem, especialmente com saúde e paz. Beijinhos
EliminarEmilia
Olá, minha amiga Emília, esse poema PAÍS EMERSO...CÂNTICO, de Natália Correia,
ResponderEliminardeve tocar mente e coração dos irmãos portugueses, que viveram na época triste e dura
da Ditadura em Portugal. Esse poema diz bem do talento dessa poeta, que li e chamou minha
atenção por sua construção poética e pelo seu tema. Nós, aqui no Brasil, vivemos também, uma Ditadura por 21 anos. Sabemos como isso tolhe e machuca. Mas, parece que em Portugal ainda foi pior, e mais longa. Uma tristeza que nunca se esquece.
Grato pela partilha do poema e por ter me dado a conhecer essa excelente poeta.
Votos de um ótimo final de semana para a família.
Muita saúde e paz para todos.
Beijo, amiga.
É verdade, Pedro, tivemos uma ditadura muito longa, agravada pela guerra colonial que matou muitos jovens e deixou em muitos sequelas que até hoje não conseguem ultrapassar. Viveram esse drama o meu irmã e o meu marido que, felizmente, voltaram bem e sem problemas psicológicos. Foi um período muito duro, Amigo. Obrigada pelo carinho e desejo que estejas be, assim como os teus queridos. Um beijinhoEmil8a
EliminarGreat blog
ResponderEliminarPlease read my post
ResponderEliminarObrigada pela visita, Rajani! Beijinho
EliminarEmilia
Olá, querida amiga, que poema mais triste, Emília, e ao mesmo tempo comove!
ResponderEliminarQue anos esses das Ditaduras, e pensar que ainda estão por aí fazendo gente sofrendo muito...
Essa poeta é maravilhosa, tudo o que escreve vai passando em nossas cabeças, trazendo
muita coisa à nossa memória. As coisas que muitos viveram, e outros que ainda vivem.
Que loucura.
Grande postagem! Aplaudo daqui.
Um feliz fim de semana pra ti e tua querida família!
Beijinhos. 🌹🌹🌹
Pois é, Amiga, estamos a viver tempos terriveis e, se aqui, Natália Correia escreve sobre o sofrimento em época de ditatura. , vemos que a miséria humana é de assustar qualquer que seja o tipo de governo. Sempre houve guerras, desigualdades sociais e poderosos pisando no
EliminarPovo sem dó nem piedade, mas, em pleno século XXI, com tantos avanços e maravilhosas conquistas em todas as áreas, tinhamos a esperança que a sensatez do ser humano também evoluisse, mas...nada; continua um bicho perigoso que mata por nada. Como bem dizes: " que loucura "! Obrigada, Tais, pelo carinho e vamos lá...seguindo a vida, fazendo a nossa parte, tentando a todo o custo preservar a nossa sanidade mental ; perante o que vemos, é dificil, mas há que tentar. Beijinhos
Emilia
Natália Correia. Os poemas que escreveu tocam sempre no fundo de quem os lê. Foi bom encontrá-la aqui, minha Amiga Emília. E gostei do cartaz: "Não deixe que a pobreza se torne em paisagem". Devia estar espalhado por todos os lados.
ResponderEliminarTudo de bom.
Uma boa semana.
Um beijo.
Infelizmente, Graça, esse cartaz não está espalhado por toda a parte, mas a pobreza, essa, vê-se em qualquer canto. Na ditadura via-se muita miséria e, apesar de se ter feito alguma coisa para a minorar, ainda há muito por fazer e , perante as guerras actuais e bárbaras,, não sei, Amiga, como será daqui em diante; a paisagem será " de arrepiar " , mas teremos de a olhar com coragem e fazer a nossa parte; não podemos, simplesmente, fechar os olhos e fingir que nada está a acontecer. Obrigada, querida Amiga e espero que esteja todos de saúde aí em casa. Beijinhos
EliminarEmilia
Comemorou-se a 13 de Setembro o Centenário do seu nascimento. Natália Correia, senhora de uma personalidade forte e destemida que soube dizer o que tinha para dizer. Mas também com um outro
ResponderEliminarlado que a sua poesia nos faz conhecer e que nos dá a conhecer a sensibilidade da sua alma. Por exemplo, esta "Ode à Paz":
"Pela verdade, pelo riso, pela luz, pela beleza,
Pelas aves que voam no olhar de uma criança,
Pela limpeza do vento, pelos actos de pureza,
Pela alegria, pelo vinho, pela música, pela dança,
Pela branda melodia do rumor dos regatos,
..."
E vai por aí afora não esquecendo quase nada e terminando assim:
"...
Eu te conjuro ó paz, eu te invoco ó benigna,
Ó Santa, ó talismã contra a indústria feroz.
Com tuas mãos que abatem as bandeiras da ira,
Com o teu esconjuro da bomba e do algoz,
Abre as portas da História,
deixa passar a Vida!"
Muito obrigada, querida amiga, por estes momentos com esta grande Poetisa que
marcou a sua época e que continua a inspirar-nos.
Beijinhos
Olinda
Mais que necessária esta " Ode à paz ", dadas as guerras que atormentam o nosso mundo actual; mais uma começou, com uma barbaridade tremenda que nunca imaginámos ver; soubemos de muitas outras pelos livros, também terriveis, mas que " não entravam pela nossa casa dentro " como se estivessos a vivê-la. São imagens que nos " tiram o sono " e que nos levam a ter vergonha de pertencermos à raça humana, querida Olinda. Não há palavras capazes de definir tamanha barbaridade. Amiga, muito obrigada, pelo carinho e desculpa a ausência, mas ainda tenho cá o meu irmão e tenho que lhe dar atenção. Na próxima semana já volta ao Brasil; 40 dias que foram muito bons, mas a vida deles está lá e, claro, têm de ir. Espero que estejam todos bem e que tenham um bom fim de semana Beijinhos e vamos lá...tentando preservar a nossa serenidade perante estes factos terriveis
EliminarEmilia
Os tenentes que fazem a ronda... agora são as instituições de crédito, que garantem a todos um lugar ao sol, se os juros dos empréstimos não forem pagos atempadamente... em condomínio arejado... debaixo de uma qualquer ponte, com a crise da habitação na ordem do dia. E uma grande maioria dos cidadãos já vive a crédito... para ter algo mais do que apenas o básico, ou fazer face a um imprevisto. Nunca como agora, houve tantos pobres... e pobreza disfarçada... desde que passámos a financiar guerras que nos haverão de arrastar para elas, (não sem antes desfrutarmos dos encantos da crescente inflação...) sempre foi assim ao longo da história do mundo... só variando a escala em que elas acontecem... Adorei este poema de Natália! Super actual! A cada dia, a pobreza arrasta gente de todos os países em efeito dominó, infelizmente... sob jogos de poder, em que entusiasticamente nos fazem crer que financiamentos de guerra é a nossa melhor defesa...
ResponderEliminarA pobreza pelo mundo, infelizmente, já há muito que está instalada... achávamos que ela ficaria contida nos seus locais de origem... mas ela é a nova pandemia que atravessa o globo, com efeitos transversais... e infiltra-se em cada país, pois ignorámos por tempo demais, as causas da mesma em vários pontos do globo...
Cada vez mais, tenho a sensação que na mão dos políticos... somos mesmo todos paisagem!
Creio que foi George Orwell que em tempos disse: Um dia os pobres serão tantos, que não haverá lugar para os ricos. Esse dia está rapidamente a chegar, com a agravante das alterações climáticas... a apressar o processo. Quando o ar se tornar irrespirável... o que se planta... o que se come... o que se bebe?
Aqui estamos quase em Dezembro sem chuva (e a ver os preços dos supermercados a subir em flecha de novo, com o comércio em crise pois as compras de Outono não se fazem. Quem precisa de roupas novas de Outono/Inverno, se o tempo seco continua?)... o Rio Madeira, o maior afluente do Amazonas está seco. Quanto o pulmão do mundo, a Amazónia está afectado... significa que todos os seres que precisam de ar respirável no mundo, também o serão... apenas andamos distraídos com demasiadas guerras no momento, para nos lembrarmos disso... ainda conservamos a esperança de encontrarmos ar respirável, em frascos, num qualquer Shopping se tal for necessário... sem pensarmos que acumulámos uma pesada factura ambiental: mudámos demais a face do mundo, em pouco mais de um século e meio... em sucessivas e inesgotáveis necessidades...
Mais uma publicação, sobre um tema bem quente da actualidade, por aqui! Excelente escolha como sempre, Emília! Um tema com muito pano para mangas... mas já andamos quase todos de tanga... da crise... e do calor que perdura fora de tempo...
Beijinhos! Continuação de uma feliz semana!
Ana
" Um tema com muito pano para mangas ", Ana e tu, com o teu belo e assertivo comentário disseste o que faltou neste tão actual poema de Natália Correia. O ser humano não tem emenda e continua a maltratar o planeta, queimando, sujando e, como se isso não bastasse, está a dar cabo da população com guerras cada vez mais violentas, com armamento sofisticado que não poupam nem mesmo as crianças indefesas. Não há palavras para defininir tamanha bestialidade, Amiga! Agradeço-te muito a tua visita e peço desculpas pela ausência, mas tenho tido cá o meu irmão e cunhada ( vivem no Brasil ) e tenho que lhes dar atenção. Na próxima quinta já voltam e aí terei mais disponibilidade. Claro que vou sentir a falta deles, mas a vida é assim...
EliminarBeijinhos e espero que estejam bem de saúde, especialmente a tua mãe
Emilia
Grande poema de um grande poeta.
ResponderEliminarBeijinhos. Desejo-te uma ótima semana.
Obrigada, Jaime! Creio que viveste esta época ( não sei a tua idade ????), de ditadura e muita miséria, principalmente nas aldeias do nosso Portuga; felizmente, muita coisa mudou, apesar da pobreza continuar. Beijinhos e fica bem, com saúde, principalmente
EliminarEmilia
Natália Correia, a poeta indomável e corajosa opositora do salazarismo, merece ser recordada e homenageada.
ResponderEliminarExcelente poema partilhaste, amiga Emilia.
Beijo, uma semana de muita paz.
(Obrigada querida, pelo lindo comentário que deixaste no Pétalas.)🙏💙
Sim, Teresa, aqui ela relata um período que conheces bem e que, felizmente acabou, embora ainda haja muita coisa a fazer. Obrigada pelo carinho da visita e desculpa a minha ausência, mas estas guerras deixam-me perturbada e sem ânimo Um abraço apertadinho, carregadinho de amizade
EliminarEmilia
Saudade de Você Emilia!
ResponderEliminarBjins
CatiahoAlc.
Ando bastante " sumida ", Catiaho, mas, logo, logo visitar-te-ei. Um beijinho e obrigada pelas palavras tão simpáticas
EliminarEmilia
Querida Emília
ResponderEliminarApetece-me dizer: Natália Correia em todo o seu esplendor!
Este poema é particularmente forte e acutilante. Em meu entender merece uma segunda leitura, e assim concluiremos que, infelizmente, ele tem enormes semelhanças com a actualidade.
RE: Muito obrigada, minha amiga, pelas tuas palavras de incentivo lá no meu canto. Eu vou melhorando, mais devagar do que eu desejaria... mas há que ter calma até que tudo volte à normalidade. Aos poucos comecei a visitar os blogues amigos, um hoje outro amanhã, porque não posso estar muito tempo no computador.
Um abraço muito apertadinho, carregado da mais pura amizade.
Continuação de boa semana.
Beijinhos
MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS
Fiquei muito feliz por saber que estás a melhorar, Está a ser devagar, mas o importante é que voltes a ter saúde, Mariazita. Não te preocupes com a demora, pois os teus Amigos esperam-te o tempo que for preciso. Que tudo continue a correr bem é o que te desejo Amiga do coração. Um beijinho muito, muito especial. FORÇA!
EliminarEmilia
Olá Mariazita! Não conhecia a obra de Natália Correia. O poema reflete a visão crítica e inconformista da autora sobre a realidade portuguesa da época, marcada pela ditadura, pela pobreza, pela repressão e pelo isolamento. O poema é um convite à rebeldia e à liberdade, expressando o desejo de romper com o conformismo e a resignação que dominavam a sociedade. O poema também revela a sensibilidade e a criatividade da autora. Gostei imenso! Grande beijo.
ResponderEliminarFoi um periodo dificil, Beto, porque além da falta de liberdade, tivemos uma guerra longa, que matou muitos jovens, uma guerra injusta, contra os povos que queriam simplesmente a sua independência e que poderia ter sido dada, muito mais cedo. Não quer dizer que as democracias não tenham os seus problemas, mas, pelo menos, podemos sair à rua em protesto e mudar os governantes em eleições livres. Amigo, muito obrigada pelo carinho da visita e desculpa a ausência. Logo, logo, irei ai tomar um cafezinho. Um beijinho e saúde para todos
EliminarEmilia