terça-feira, 29 de dezembro de 2020

ANO NOVO

Imagem- Pixabay


 Para você ganhar belíssimo Ano Novo
 cor do arco-íris, ou da cor da sua paz, 
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
 (mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano 
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser; 
novo até no coração das coisas menos percebidas 
(a começar pelo seu interior) 
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota, 
mas com ele se come, se passeia, se ama, 
se compreende, se trabalha, 
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
 não precisa expedir nem receber mensagens 
(planta recebe mensagens? passa telegramas?) 

Não precisa 
fazer lista de boas intenções 
para arquivá-las na gaveta. 
Não precisa chorar 
arrependido pelas besteiras consumadas 
nem parvamente acreditar 
que por decreto de esperança 
a partir de janeiro as coisas mudem 
e seja tudo claridade, recompensa, 
justiça entre os homens e as nações, 
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal, 
direitos respeitados, começando pelo direito augusto de viver. 

Para ganhar um Ano Novo 
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo, 
tem de fazê-lo novo, 
eu sei que não é fácil, 
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você 
que o Ano Novo cochila e 
espera desde sempre. 

 Carlos Drummond de Andrade - RECEITA DE ANO NOVO


Queridos amigos, agradecendo todo o carinho recebido durante este ano que está prestes a terminar, deixo este belíssimo poema , com a receita certa para que o ano 2021 seja de facto novo.  O que espero dele e o que vos desejo a todos é SAÚDE, pois sem esse bem precioso a vida perde todo o sentido Façamos o nosso melhor , a cada dia que a vida nos conceder

Um beijinho e obrigada!

Emília Pinto

segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

FELIZ NATAL


 


Queridos Amigos, quero desejar a todos um Bom Natal, com paz,  alegria  e , principalmente, com saúde

 Gostaria também de vos agradecer todo o carinho que me têm dedicado há já tantos anos 

Um beijinho e 

BOAS FESTAS

Emília Pinto




quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

NATAL

Imagem- pixabay


APRENDIZAGENS

 Era cromada e preta a bicicleta,
 trazia um laço largo no volante circulando o Natal
 e rodas generosas como parecia o mundo

 Eu, na manhã seguinte, sem saber sustentar a rota nivelada,
 o meu pai a meu lado, segurando o assento,
 a sua mão: aceso fio de prumo,
 em acesa confiança 

Depois, era-lhe a voz entrecortada
pelo puro cansaço de correr, 
tentando harmonizar a bicicleta 

Hoje, muitos anos depois de gestos paralelos,
a minha filha sobre outras estradas, 
a minha mão corrigindo o desvio de mais modernas rodas,
entendo finalmente que era emoção o que se ouvia
na voz interrompida do meu pai: 

o medo que eu caísse, mesmo sabendo que eram curtas as quedas,
mas sobretudo a ternura de me ver ali, 
a entrar no mundo dos crescidos,
em equilíbrio débil, 
rente à saída circular da infância 
 
Ana Luisa Amara

Ana Luísa Amaral venceu o prémio literário espanhol Leteo, que estava suspenso desde 2017, e cuja entrega será realizada no dia 16 de outubro no Auditório Ciudad de León
É actualmente professora de literatura e cultura inglesa e americana na faculdade de letras do Porto 

Queridos Amigos, temos, dentro de pouco tempo, a festa mais esperada do ano, principalmente pelas crianças; vai ser um Natal muito diferente, estranho, triste....mas....não podemos desanimar, porque o que importa é a saúde; outros natais teremos, se a vida assim o permitir e, alegremo-nos com aquela criança que, feliz, bem em frente à nossa janela , aprende a andar na bicicleta que o " menino Jesus " deixou no sapatinho. É tempo de aprender que podemos celebrar o nascimento de Jesus em qualquer dia do ano; é tempo de aprender que,  em qualquer momento, podemos fazer uma criança feliz; é tempo de aprender que a família deve estar unida sempre e não só no dia de Nata


SAÚDE, Amigos

Emília Pinto

sábado, 21 de novembro de 2020

DEIXAI....

Imagem- pixabay 


 Tenho a pedir-vos que não reutilizeis mais nada,

Este edifício junto à praia,
deixai-o entregue à ruína, 
às folhas do milho, 
ao ar salgado. 

Que as crianças possam tropeçar nas lajes soltas
e no átrio ecoe, como uma pedreira, 
o desejo de muitas mãos. 

Deixai dormir as mariposas dentro de lâmpadas partidas 
e as formigas engrossarem pelos cantos 
como sal. 

Não inventeis mais nada, 
nem formas eloquentes de evitar que o bronze oxide. 
Aceitai o suor do tempo. 
Que algumas coisas apodreçam. 

Que os elefantes atravessem a planície. 
Que as veias rebentem do esforço de permanecer em pé
E que nem tudo se sustente como a rosa
se sustenta de florir. 

Deixai, deixai os vários pisos incomunicáveis, 
o desvão ser cortejado pelo giz dos aviões, 
que a lua pouse ali aberto o crânio,
que lhe bata o sol. 

Ainda são precisos os templos 
onde o pó seja gentil 
e incensado 
como os pés pela caruma dos pinhais

Poema de Andreia C Faria
in Singularidade- Poesia e etc


Conheci esta jovem escritora no blog do nosso Amigo Juvenal Nunes, PALAVRAS ALADAS. e decidi conhecê-la melhor. Escolhi este poema para partilhar com os meus amigos. Espero que gostem!

Emília Pinto 

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sábado, 7 de novembro de 2020

UM MUNDO COM MENOS



 

Imagem- pixabay


" Minha infância foi a comum da classe média brasileira de então. Se eu tivesse de identificar a grande diferença entre ser uma criança em 1970 e hoje, no mesmo patamar social, apontaria para a variedade atual. Variedade do quê? Tudo.

Sobre a mesa da nossa cozinha repousavam bananas, laranjas, ocasionalmente maçãs.....Surgia de quando em vez um tipo de mamão amarelo e algum melão, Nada de kiwis ou da bela e insípida fruta- dragão. Desconhecíamos physalis. Vi a minha primeira lichia já doutor. Havia chocolates. Eram sempre doces e com leite......hoje...com leite, com pimenta, com grãos de flor de sal, etc, etc.....

Eu usava um calçado esportivo Ki-chute....hoje, uma prateleira de tênis na loja é uma festa de cores cada vez mais impressionantes. É difícil escolher agora, em parte porque ficaram mais caros, em parte porque trazem excesso de informações....

O desejo de consumo existe em todos os grupos sociais, ainda que nem todos possam atendê-lo, Zygmund Bauman chega a sugerir que as lojas sejam denominadas farmácias, porque oferecem remédios para vários males. Está triste hoje? Compre! Está eufórico? Compre! Está com tédio? Compre! O mundo da internet tem um efeito secundário importante, Ele escancara a possibilidade de tudo para todos, Mesmo que eu não possa comprar X ou Y estou exposto às ofertas.....

Havia diferenças sociais ( inclusive maiores do que as de hoje ) quando eu tinha 7 anos. Havia pobres e ricos e , provavelmente, um maior conformismo com as desigualdades. É difícil comparar épocas. Queríamos coisas e desejávamos consumir. Tenho a sensação subjetiva de que aceitávamos melhor a recusa da nossa vontade. Não era necessário, parece, que as crianças fossem intensamente felizes 24 horas por dia....

Como explicar que a diminuição visível da desigualdade de renda em alguns anos deste século não foi acompanhada de uma queda de furtos ou roubos? Devemos levar em conta que a força do consumo aumentou e nem sempre o crime é famélico. A lei é quebrada  pela busca de status, por um celular mais avançado e pelo tênis importado. Matamos e morremos por logomarcas e seu valor simbólico. Uns estão entediados pelo excesso e outros ressentidos pela falta. Ambos constituem uma dupla complicada para um projeto nacional."


Excertos do capítulo Um Mundo com menos, do livro O Coração das coisas  de 

Leandro Karnal


Amigos, muito haveria a transcrever deste capítulo, mas ficaria um post muito longo. Estes

 excertos bastam para partilhar a mensagem que dele retirei. Estes tempo de pandemia têm-nos forçado a viver com menos, inclusive, com menos manifestações de afecto e esta  é a pior das carências.  Não creio que algo vá mudar na mentalidade humana, mas temos que manter a esperança.... 

temos de aprender a viver com menos, aliás há muito que esse aprendizado era necessário


Emília Pinto.   

 

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sábado, 24 de outubro de 2020

O MEDO

 


Letra

Provisoriamente não cantaremos o amor
que se refugiou mais abaixo dos subterranêos
Cantaremos o medo que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio porque esse não existe, 
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro
o medo grande dos sertões, dos mares, do deserto
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo do depois da morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas

Carlos Drummond de Andrade

Significado e importância do poema Congresso Internacional do Medo


Carregando uma forte e pesada reflexão crítica, a composição vem dar voz à falta de esperança que invadia os indivíduos durante a década de 40 e também nos tempos que se seguiram. Na verdade, os traumas daquele período histórico e as mazelas que ele deixou nos indivíduos acabaram se perpetuando através do tempo e permanecem na nossa história coletiva. Assim, décadas mais tarde, continuamos sendo assombrados pelo terror e a crueldade do conflito que abalou o mundo. Mais
do que uma composição poética, trata-se do desabafo de um sujeito que precisa sobreviver numa época de mudanças bruscas e violentas.

in- Cultura Genial




Não estamos a viver uma guerra mundial, mas, estamos a travar uma luta com um inimigo invisivel que está a espalhar o medo pelo mundo inteiro O medo está a ser internacional, global e o que é pior, sabemos muito pouco sobre o nosso inimigo.

Emília Pinto

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

GITA- RAÚL SEIXAS



Eu, que já andei pelos quatro cantos do mundo procurando 
Foi justamente num sonho que Ele me falou 
Às vezes você me pergunta
Por que é que eu sou tão calado
Não falo de amor quase nada 
Nem fico sorrindo ao seu lado 
Você pensa em mim toda hora 
Me come, me cospe, me deixa 
Talvez você não entenda 
Mas hoje eu vou lhe mostrar 
eu sou a a luz das estrelas
Eu sou a cor do luar
Eu sou as coisas da vida
Eu sou o medo de amar 
Eu sou o medo do fraco 
A força da imaginação O blefe do jogador 
Eu sou, eu fui, eu vou 
Eu sou o seu sacrifício 
A placa de contra-mão 
O sangue no olhar do vampiro 
E as juras de maldição 
Eu sou a vela que acende 
Eu sou a luz que se apaga 
Eu sou a beira do abismo 
Eu sou o tudo e o nada 
Por que você me pergunta? 
Perguntas não vão lhe mostrar que eu...






 Para alguns, um doido, para outros, um gênio. E por que não os dois? Somente Raul Seixas poderia escrever uma música como Gita, cuja inspiração veio do livro Bhagavad Gita, conhecido como um dos mais importantes textos da cultura indiana, escrito no século 4 antes de Cristo. A obra fala sobre quais seriam os caminhos para o homem evoluir espiritualmente, apresentados através de um diálogo entre Krishna, a representação de Deus, e Arjuna, um discípulo guerreiro.



Espero que gostem!, Eu gosto muito da " loucura" deste " génio ". Faz pensar!!!


 Amigos,  letra não está completa por ocupar demasiado espaço, mas, penso que conseguirão entender o que Raúl Seixas diz


Emilia Pinto



domingo, 27 de setembro de 2020

DIVINA COMÉDIA






Erguendo os braços para o céu distante 
E apostrofando os deuses invisíveis,
Os homens clamam: — «Deuses impassíveis,
A quem serve o destino triunfante, 

Porque é que nos criastes?!Incessante 
Corre o tempo e só gera, inestinguíveis, 
Dor, pecado, ilusão, lutas horríveis
N'um turbilhão cruel e delirante...

Pois não era melhor na paz clemente
Do nada e do que ainda não existe,
Ter ficado a dormir eternamente?

«Porque é que para a dor nos evocastes?»
 Mas os deuses, com voz inda mais triste,
 Dizem:— «Homens! por que é que nos criastes?»


 Antero de Quental, in "Sonetos" 


Infelizmente, há quem faça essa pergunta, muitas vezes!

Emília Pinto

terça-feira, 15 de setembro de 2020

CANÇÃO DE OUTONO

 Imagem pixabay


Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi. 
De que serviu tecer flores
pelas areias do chão
se havia gente dormindo 
sobre o próprio coração? 

E não pude levantá-la! 
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza 
é que sou triste e infeliz. 
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força 
estão velando e rogando
aqueles que não se levantarão... 

Tu és folha de outono 
voante pelo jardim. 
Deixo-te a minha saudade 
- a melhor parte de mim. 
E vou por este caminho, 
certa de que tudo é vão. 
Que tudo é menos que o vento, 
menos que as folhas do chão... 

 Cecília Meireles , Poesia completa: Volume 2. Rio de Janeiro:


Emociona, este belo poema!

Emília Pinto


terça-feira, 1 de setembro de 2020

REGRESSO


Quando eu voltar
que se alongue sobre o mar,
o meu canto ao Creador!
Porque me deu, vida e amor,
para voltar...

Voltar... Ver de novo baloiçar
a fronde magestosa das palmeiras
que as derradeiras horas do dia,
circundam de magia...
Regressar... 
Poder de novo respirar, 
(oh!...minha terra!...)
aquele odor escaldante
que o humus vivificante do teu solo encerra!
Embriagar...
uma vez mais o olhar,
numa alegria selvagem,
com o tom da tua paisagem,
que o sol,
a dardejar calor,
transforma num inferno de cor..

Não mais o pregão das varinas,
nem o ar monotono,
igual, do casario plano...
Hei-de ver outra vez 
as casuarinas a debruar o oceano...
Não mais o agitar fremente de uma cidade em convulsão...
não mais esta visão,
nem o crepitar mordente destes ruidos... 
os meus sentidos
anseiam pela paz das noites tropicais
em que o ar parece mudo,
e o silêncio envolve tudo
Sede...Tenho sede dos crepusculos africanos,
todos os dias iguais, e sempre belos,
de tons quasi irreais...
Saudade...Tenho saudade do horizonte sem barreiras...,
das calemas traiçõeiras, das cheias alucinadas...
Saudade das batucadas
que eu nunca via 
mas pressentia em cada hora,
soando pelos longes, noites fora!...
Sim! Eu hei-de voltar,
tenho de voltar,
não há nada que mo impeça.
Com que prazer hei-de esquecer toda esta luta insana...
que em frente está a terra angolana,
a prometer o mundo a quem regressa...

Ah! quando eu voltar... 
Hão-de as acacias rubras,
a sangrar numa verbena sem fim,
florir só para mim!...
E o sol esplendoroso e quente, o sol ardente,
há-de gritar na apoteose do poente, o meu prazer sem lei...
A minha alegria enorme
de poder enfim dizer:
Voltei!... 

Alda Lara -  poetisa Angolana
in- escritas,org.pt


Estou de regresso depois de uma longa pausa e as saudades deste cantinho já começavam a sentir-se Espero que gostem deste poema, nostálgico, mas muito belo; assim é também a saudade...

Emília Pinto

 






sábado, 1 de agosto de 2020

AGOSTO - PAUSA




imagem. Pixabay



Bem vindo Agosto
que seja lindo
do desgosto oposto
no amor luzindo
a gosto, com gosto
nas realizações infindo
ao meu, ao teu
avindo
num apogeu
Agosto... Seja bem vindo!



Poeta mineiro do cerrado - LUCIANO SPAGNOL

Queridos Amigos, chegou Agosto, um mês de férias para a maioria das pessoas aqui em Portugal, o mês de pausa para o Começar de Novo. Gostariamos todos que ele fosse " lindo e abençoado " como de costume,  mas, infelizmente, vai ser um mês muito diferente,  triste e muito, muito doloroso para muitas pessoas.. Mesmo assim, escolhi este poema que lhe dá as boas vindas, pois temos de  vivê-lo o melhor possível..temos de tentar vivê-.lo " a gosto...com gosto "

Deixo- vos um abraço,  o meu agradecimento pelo carinho que sempre recebo de todos e desejo-vos dias tranquilos com Saúde e a alegria possível 



Emília Pinto

sexta-feira, 10 de julho de 2020

HUMANIDADE






imagem- pixabay


Deixemos a Humanidade à Sua Ordem Natural
Não aleijemos a pobre humanidade mais do que ela já está com tantas sacudidelas da direita para a esquerda e da esquerda para a direita, de cima para baixo e de baixo para cima. Do individualismo para o colectivismo e do colectivismo para o individualismo. Não sejamos tão crianças que queiramos levantar ao ar a esfera pretendendo agarrá-la apenas pelo hemisfério da direita ou apenas pelo da esquerda, ou apenas pelo hemisfério superior, porque a única maneira de agarrá-la bem tão-pouco é pôr-lhe as mãos por baixo, nem ainda abraçando-a com os dois braços e os dedos metidos uns nos outros para não deixar escapar as mãos e com o próprio peito do lado de cá a ajudar também; a única maneira de equilibrar a esfera no ar é deixá-la estar no ar como a pôs Deus Nosso Senhor, ás voltas à roda do sol, como a lua à roda de nós e assegurada contra todos os riscos dos disparates da humanidade.
Não temos mais remédio do que ir aprender tecnicamente como funcionam estas coisas tão naturais!
O Mundo da Natureza é o modelo dos modelos de todas as maquinarias, porque não havemos então de acertar também o mundo social no seu próprio funcionamento como todas as outras máquinas do mundo?

Almada Negreiros, in "Ensaios"

"Não temos mais remédio"  do que aprender " à força" que  a Natureza tem de ser respeitada. Espero que aprendamos com este sinal que ela nos enviou.

Há muito que não lia nada de Almada Negreiros e este texto agradou-me muito porque trata um tema que nos preocupa. Espero que gostem.

Emília Pinto
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terça-feira, 16 de junho de 2020

A VIDA











Imagem- pixabay




A vida, as suas perdas e os seus ganhos, a sua
mais que perfeita imprecisão, os dias que contam
quando não se espera, o atraso na preocupação
dos teus olhos, e as nuvens que caíram
mais depressa, nessa tarde, o círculo das relações
a abrir-se para dentro e para fora
dos sentidos que nada têm a ver com círculos,
quadrados, rectângulos, nas linhas
rectas e paralelas que se cruzam com as
linhas da mão;

a vida que traz consigo as emoções e os acasos,
a luz inexorável das profecias que nunca se realizaram
e dos encontros que sempre se soube que
se iriam dar, mesmo que nunca se soubesse com
quem e onde, nem quando; essa vida que leva consigo
o rosto sonhado numa hesitação de madrugada,
sob a luz indecisa que apenas mostra
as paredes nuas, de manchas húmidas
no gesso da memória;

a vida feita dos seus
corpos obscuros e das suas palavras
próximas.


Nuno Júdice, in "Teoria Geral do Sentimento



No  post anterior, escolhi o poema de Manuel Bandeira, a ESTRADA e agora partilho um de Nuno Júdice que fala da VIDA. . Dois poema que não conhecia, mas que, tenho consciência, abordam o mesmo tema; no entanto e, dadas as circunstâncias actuais, a nossa vida está confusa, está  um emaranhado de emoções, um quebra-cabeças autèntico ; são tantas as dúvidas e incertezas que muitas vezes não consigo "encaixar a peça " no seu devido lugar .Mas não podemos desistir..".a Luz deixará de ser indecisa"


Emília Pinto











quinta-feira, 4 de junho de 2020

ESTRADA






Imagem . pixabay





Esta estrada onde moro, entre duas voltas do caminho,
Interessa mais que uma avenida urbana.
Nas cidades todas as pessoas se parecem.
Todo o mundo é igual. todo o mundo é toda a gente.
Aqui, não: sente-se bem que cada um traz a sua alma.
Cada criatura é única.
Até os cães.
Estes cães da roça parecem homens de negócios:
Andam sempre preocupados.
E quanta gente vem e vai!
E tudo tem aquele caráter impressivo que faz meditar:
Enterro a pé ou a carrocinha de leite puxada por um bodezinho
manhoso.
Nem falta o murmúrio da água, para sugerir, pela voz dos símbolos,
Que a vida passa! que a vida passa!
E que a mocidade vai acabar.

Manuel Bandeira, in 'Bandeira de bolso: uma Antologia Poética'


" A vida passa....a mocidade vai acabar... "

Nem sempre podemos escolher o caminho, mas, se pudermos, escolhamos aquele que  tem mais beleza, o das coisas simples.


Emília Pinto





domingo, 17 de maio de 2020

AS COISAS SECRETAS....





.imagem- pixabay



..... da Alma


Em todas as almas há coisas secretas cujo segredo é guardado até à morte delas. E são guardadas, mesmo nos momentos mais sinceros, quando nos abismos nos expomos, todos doloridos, num lance de angústia, em face dos amigos mais queridos - porque as palavras que as poderiam traduzir seriam ridículas, mesquinhas, incompreensíveis ao mais perspicaz . Estas coisas são materialmente impossíveis de serem ditas. A própria Natureza as encerrou - não permitindo que a garganta humana pudesse arranjar sons para as exprimir - apenas sons para as caricaturar. E como essas ideias-entranha são as coisas que mais estimamos, falta-nos sempre a coragem de as caricaturar. Daqui os «isolados» que todos nós, os homens, somos. Duas almas que se compreendam inteiramente, que se conheçam, que saibam mutuamente tudo quanto nelas vive - não existem. Nem poderiam existir. No dia em que se compreendessem totalmente - ó ideal dos amorosos! - eu tenho a certeza que se fundiriam numa só. E os corpos morreriam

Mário de Sá Carneiro, in Cartas a Fernando Pessoa

E são essas "coisas secretas da alma " que tornam o ser humano tão complexo, com atitudes incompreensíveis, mesquinhas....aterradoras, tantas vezes....

Emília Pinto

quinta-feira, 30 de abril de 2020

PACIÊNCIA






Daqui para a frente continuaremos a precisar de PACIÊNCIA mas, teremos de ter uma enorme RESPONSABILIDADE, para não pormos em risco a nossa saúde e a dos outros.



 " A vida é rara "! Tenhamos paciência! Sejamos responsáveis!


Espero que estejam todos bem!

Emília Pinto





sábado, 18 de abril de 2020

CARÊNCIAS









Quem não gosta de ser amado?  De receber atenção especial? Quem não gosta de beijo na boca e abraços apertados? Quem prefere a solidão a uma boa companhia?
Nesse mundo maluco e agitado, as pessoas estão se encontrando hoje, se amando amanhã e entrando em crise depois de amanhã.

Uma coisa frenética e louca, que tem feito muita gente que se julgava equilibrada perder os parafusos e fazer muita besteira. Paixão, loucura e obsessão, três dos mais perigosos ingredientes que estão crescendo nos relacionamentos de hoje em dia por causa da velocidade das informações e o medo de ficar sozinho.

As pessoas não estão conseguindo conviver sozinhas com seus defeitos, vícios e qualidades e partem desesperadamente para encontrar alguém, a tal da alma gêmea, e se entregam muitas vezes aos primeiros pares de olhos que piscam para o seu lado.

Vale tudo nessa guerra, chat, carta, agência, festas. É uma guerra para não ficar sozinho. Medo, medo de se encarar no espelho e perceber as próprias deficiências, medo de encarar a vida e suas lutas. Então a pessoa consegue alguém
(ou acha que está nascendo um grande amor), fecha os olhos para a realidade e começa a viver um sonho, trancado em si mesmo, transfere toda a sua carência para o(a) parceiro(a), transfere a responsabilidade de ser feliz para uma pessoa que na verdade ela mal conhece.

Então, um belo dia, vem o espanto, vem a realidade, o caso melado, o “falso amor” acaba, e você que apostou todas as suas fichas nesse romance fica sem chão, sem eira nem beira, e o pior: muitas vezes fica sem vontade de viver.

Pobre povo desse século da pressa! Precisamos urgentemente voltar ao costume “antigo” de “ter tempo”, de dar um tempo para o tempo nos mostrar quem são as pessoas. 

Luís Fernando Veríssimo



Não conseguíamos ter esse Tempo, mas agora, chegou um vírus e o tempo,  como por milagre, apareceu; o povo deixou de ter pressa.

Amigos, espero que estejam todos bem 

Emília Pinto


















sexta-feira, 3 de abril de 2020

NOVO TEMPO





Sobreviveremos a estes tempos difíceis,sim! Temos de manter a esperança de que, depois de tudo passar,  UM NOVO TEMPO virá,  com as pessoas mais unidas, mais solidárias, mais humanas.


Espero que estejam todos bem e que não desanimem . É difícil ficar em casa, mas pior seria se não tivessemos casa

Emília Pinto

. . 

quinta-feira, 19 de março de 2020

ESPERANÇA








Se quiseres partir amanhã
eu paro o mundo
com facilidade assim
com esta mão
e então descobriremos
o mais profundo fundo que há no mundo
que é no irmos fundo às coisas
que há razão
de verdades consumadas me consomem
de falácias bem montadas me alimentam
mas meu filho mora o reino do futuro
que é mais duro
e não vai ser com palavras
que o contentam

Se a morte lenta te rebenta sob a pele
a cada dia
e se no teu braço apenas sentes a força
de um cansaço organizado
mas manténs na tua fronte a dúvida
e o gosto pelo longe e a maresia
e se sentes no teu peito de criança
a alma de um sonho amordaçado
se quiseres partir amanhã
eu paro o mundo
com facilidade assim
com esta mão
e então descobriremos o mais profundo
fundo que há no mundo
que é no irmos fundo às coisas que há razão

(iste mundus furibundus falsa prestat gaudia
quia fluunt et decurrunt ceu campi lilia
Laus mundana vita vana vera tillit premia

Pedro Barroso


 Pedro Barroso faleceu, na passada segunda-feira, vítima de doença prolongada: é considerado um dos cantores de Abril e" o ULTIMO  TROVADOR DE UMA GERAÇÃO INTERVENTIVA",


Espero que gostem!

Emília Pinto



quarta-feira, 4 de março de 2020

OS AMIGOS....


Foto retirada da net





.... revelam-se


Pode ser esclarecedor recordar que o termo latino para amizade, amicitia, deriva da raiz am, que no latim popular designa «mãe» (amma) e «ama» (mama). A etimologia da amizade reenvia-nos, assim, não para uma qualquer experiência casual, mas para a memória daquela afeição primeira que estrutura silenciosamente a existência. Por isso, na sua espantosa leveza, e sem alardes, a amizade dialoga com coisas muito fundas dentro de nós: faz-nos reviver o primeiro amor com que fomos (ou não fomos) amados; toca as nossas feridas, mesmo as que não conseguimos verbalizar; transmite-nos confiança para sermos o que somos e como somos; estimula-nos a progredir vida fora.
Nem todas as nossas amizades chegam a tomar consciência da extraordinária viagem interior que as mobiliza. Porém, mesmo quando a amizade parece simplesmente prosaica, é este programa que realiza, pois há sempre um instante em que os verdadeiros amigos se revelam como aqueles que estão dispostos a acompanhar-nos aconteça o que acontecer.
Não esperamos nada dos nossos amigos, e essa franqueza é fundamental. Mas, não esperando nada, esperamos tudo, na medida em que a sua existência nos permite existir. A doçura da amizade é equivalente a esse seu rigor mais infrangível: o meu amigo é este próximo que não deixa de ser distante. Mas é também o distante que sabe tornar-se próximo e íntimo Por isso, não é a posse que conta na amizade, mas a afeição, a dádiva atuada no desprendimento.

José Tolentino Mendonça, in 'O Pequeno Caminho das Grandes Perguntas'


Escolhi este texto para, mais uma vez, vos agradecer a afeição, a dádiva, a amizade neste meu instante dolorido que, infelizmente chegou e que, com o tempo se transformará em instantes de grande saudade

Dizer, MUITO OBRIGADA, AMIGOS, é muito pouco; deixo-vos um enorme abraço. carregadinho de Amizade e gratidão

Emília Pinto

domingo, 16 de fevereiro de 2020

PAUSA

QUERIDOS AMIGOS,

Infelizmente, terei de fazer uma pausa, aqui, no Começar de novo. A saúde da minha MÃE agravou-se muito e está, desde hoje de manhã, nos cuidados intensivos, como sabem, no Brasil. Não sei ainda o que vou fazer, só sei que estou a sentir- me " sem chão"

Um beijinho

Emília Pinto 

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

ANIVERSÁRIO





Hoje, o Começar de Novo faz 11 anos, mas, AMIGOS, não é ele que está de parabéns, por isso,

NÃO HÁ BOLO!
NÃO HÁ VELAS!
NÃO HÁ CHAMPAGNE!




HÁ, SIM, ESTA MENSAGEM DE VINICIUS DE MORAES que, com muito carinho, vos dedico
HÁ O MEU AGRADECIMENTO pelo tanto que têm dado ao Começar de Novo
HÁ A MINHA GRANDE AMIZADE por todos vós
HÁ A PROMESSA de continuar por aqui, fazendo o meu melhor, enquanto a vida o permitir


" A GENTE NÃO FAZ AMIGOS, RECONHECE-OS "

Eu reconheço-vos pelas palavras, queridos Amigos!
Espero continuar a merecer o vosso carinho. Muito obrigada!

Um abraço carregadinho de amizade

Emília Pinto


quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

COMUMENTE É ASSIM


foto da net





Cada um ao nascer
traz sua dose de amor,
mas os empregos,
o dinheiro,
tudo isso,
nos resseca o solo do coração.
Sobre o coração levamos o corpo,
sobre o corpo a camisa,
mas isto é pouco.
Alguém
imbecilmente
inventou os punhos
e sobre os peitos
fez correr o amido de engomar.
Quando velhos se arrependem.
A mulher se pinta.
O homem faz ginástica
pelo sistema Muller.
Mas é tarde.
A pele enche-se de rugas.
O amor floresce,
floresce,
e depois desfolha.


Vladimir Maiakóvsky, in Pensador


Voltei a este poeta, como prometido e gostei muito deste poema
Grandes verdades  ele nos traz aqui!

Mas a vida é assim..." com longas e silenciosas metamorfoses "


Emília Pinto




terça-feira, 14 de janeiro de 2020

ESTRELA






Escutai! Se as estrelas se acendem
será por que alguém precisa delas?
Por que alguém as quer lá em cima?
Será que alguém por elas clama,
por essas cuspidelas de pérolas?
Ei-lo aqui, pois, sufocado, ao meio-dia,
no coração dos turbilhões de poeira;
ei-lo, pois, que corre para o bom Deus,
temendo chegar atrasado,
e que lhe beija chorando
a mão fibrosa.
Implora! Precisa absolutamente
duma estrela lá no alto!
Jura! Que não poderia mais suportar
essa tortura de um céu sem estrelas!
Depois vai-se embora,
atormentado, mas bancando o gaiato
e diz a alguém que passa:
"Muito bem! Assim está melhor agora, não é?
Não tens mais medo, hein?"
Escutai, pois! Se as estrelas se acendem
é porque alguém precisa delas.
É porque, em verdade, é indispensável
que sobre todos os tetos, cada noite,
uma única estrela, pelo menos, se alumie.


Vladimir Maiakovski


Queridos Amigos, é claro que partilho com todos vós este bonito poema, esperando, como sempre, que vos agrade.No entanto, hoje, gostaria de o dedicar à nossa Amiga, Mariazita. Há dias recebi um e-mail dela com uma fantástica mensagem deste escritor que, segundo ela, tinha muito a ver comigo e por isso a encaminhava para mim. Como devem imaginar, fiquei muito emocionada e agradecida; convivo com esta grande Amiga, há muitos anos, mas só por palavras, neste mundo dos blogues e, receber um " miminho " destes é muito gratificante. Pesquisei sobre este escritor e fiquei encantada com os seus poemas; escolhi este para vos desejar que, no céu, a cada noite, pelo menos uma estrela se alumie e vos guie nesta caminhada, nem sempre serena. Muito obrigada, Mariazita, pela amizade que me dedicas e quero que saibas que podes sempre contar comigo e que, enquanto a vida o permitir, cá estarei para continuar esta nossa amizade, virtual, segundo dizem, mas, muito, muito sincera. 

Beijinhos a todos

Emília Pinto

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

A MISSÃO DE....



.... CONTINUAR A VIDA

Ninguém se pode possuir inteiramente, porque se ignora, porque somos um mistério. Para nós mesmos. Podemos sim, ser mais conscientes de uma determinada missão que temos no mundo. Todos nós somos uma missão. Somos a missão de continuar a vida, aperfeiçoando-a, festejando-a e não destruindo-a como se está a fazer hoje. Eu não tenho certezas, mas tenho convicções e uma das minhas convicções mais firmes é que nascemos para a liberdade. E, no entanto, veja o paradoxo: essa liberdade, esse caminho para a liberdade está a ser cada vez mais obscurecido por aquilo que observamos no nosso mundo de hoje. Nós chegamos a esta coisa terrível, o chamado equilíbrio nuclear, que é o jogo de escondidas de duas disponibilidades criminosas para suprimir a humanidade. A humanidade está hoje pronta (parece que está sempre pronta!) para pôr luto por si própria. Isto não é uma forma humana de viver. Esta tragédia tem que ser a sua «húbris», que é, digamos, a arrogância que desencadeia a catástrofe punitiva. E o que me perturba muito, o que me assusta, é que países que subscrevem, que proclamam os direitos humanos, possam entrar num jogo fatal destes, um jogo que se destina a suprimir o homem.

Natália Correia, in 'Entrevista (1983)'


A nossa missão sempre foi e continuará a ser a de continuar a vida, dando-lhe o melhor de nós. A ela o que peço é saúde para assim poder cumprir essa missão.

Um beijo e  SAÚDE para todos

Emília Pinto